segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Considerações acerca das modalidades de guarda

A modalidade de guarda incidirá casuisticamente, a depender da realidade da família e do vínculo afetivo que permeia a relação paterno e materno-filial, aliando-se, a tal, ainda, outros essenciais critérios.
Quando da fixação, há que se atentar a três principais referenciais: continuum de afetividade, continuum social e continuum espacial. O primeiro diz respeito à maior ou menor segurança que sente o menor ao lado de cada dos genitores ou demais parentes indicados ao exercício de sua guarda, como, por exemplo, avós, tios ou primos com notório e exponencial vínculo afetivo. Certamente como o critério que mais serve de substrato à decisão judicial acerca da guarda, o afeto está diretamente relacionado àquele quem o menor tem como seu maior referencial e porto seguro. O segundo critério cinge-se ao ambiente no qual inserido o menor quando da separação dos pais, o que também será considerado no contexto. Por fim, o terceiro elemento a ser apreciado tange ao espaço no qual a personalidade do menor desenvolveu-se até então: seu referencial de espaço, seu ambiente comunitário e estudantil, o que também deve ser enfocado em sede de disputas pela guarda.

Destarte, a opção por uma das modalidades de guarda – ou sua imposição por parte dos magistrados – influirá significativamente na relação entre genitores e, bem assim, ao fomento ou entrave à perpetração de práticas alienadoras parentais.

Por guarda comum, tem-se aquela exercida por ambos os genitores na constância da sociedade afetiva, à luz do princípio da igualdade entre os cônjuges, ante o pressuposto de que pai e mãe são igualmente aptos aos cuidados com a prole. Assim, é a modalidade de guarda que persiste até que se irrompa a separação fática das partes, o que consequentemente dá azo à busca de regulamentação jurídica.

A guarda fática, por seu turno, é aquela exercida por indivíduo que toma a criança ou adolescente a seu encargo, sem qualquer regulamentação jurídica ou acordo. Pode ser igualmente exercida por terceiro que, após o falecimento ou separação dos genitores dos infantes, passou a desempenhar a função de guardião no plano fático. O elemento que a caracteriza é unicamente a ausência de regulamentação jurídica de uma situação vivenciada concretamente.

A modalidade ainda mais comumente vivenciada, todavia, é a da guarda unilateral, exercida por apenas uma pessoa, seja decorrência do óbito de um ou ambos genitores dos infantes, de abandono familiar ou separação e divórcio destes.

É no seio do exercício desta modalidade de guarda que, quando exercida por um dos genitores – o então “guardião” - , caberá ao outro ou mesmo a terceiro interessado o exercício da convivência familiar, princípio esculpido no artigo 227 da Constituição Federal de 1988.

Nesta perspectiva, ter-se-á um regime de convivência delimitado a dias, horários e forma de locomoção, como regra. Exceção dar-se-á com as “visitas livres”, ocasião em que não haverá uma estrita vinculação à rigidez de datas e horários predeterminados.

Ainda hoje, mesmo à lume do princípio da igualdade dos genitores e do melhor interesse da criança e do adolescente, revela-se incrustada a cultura da “guarda materna” na sociedade brasileira, o que tamanhamente desencoraja os homens à busca da custódia judicial dos filhos quando notoriamente detentores das melhores condições psíquicas, ambientais, espaciais e afetivas a seu exercício, exclusivamente devido à ausência de qualquer “fato excepcional” ou suficientemente grave a abalar a tradicional guarda materna.

Eis a espécie de guarda que mais suscita litígios judiciais de disputa da prole, mormente quando a inexistência de respeito e harmonia entre entes envolvidos – geralmente fruto de um término traumático de relação afetiva - obstrui a habilidade de diálogo e mínimo contato entre as partes.
Tanto a guarda alternada como a modalidade de aninhamento (ou nidação) são reputadas perniciosas aos infantes pela jurisprudência e melhor entendimento consagrado, tanto é que raramente são exercidas no plano material.
Como guarda alternada, tem-se a modalidade em que consubstanciada uma divisão temporal da custódia entre genitores, de modo que estes então exerçam o poder familiar em sua plenitude em tais preestabelecidos momentos. Por outra banda, são os menores submetidos a nefastas alterações de residência incessantes vezes, o que fere diretamente suas rotinas, organização e tranqüilidade emocional.

A modalidade de aninhamento (ou nidação) é a mais rara dentre as modalidades reconhecidas pelo ordenamento jurídico brasileiro. Trata de arranjos nos quais as crianças permanecem sempre morando na mesma residência, de forma fixa, com as mesmas rotinas, sendo os genitores que, por períodos alternados e estabelecidos, deslocam-se, revezando-se para atender e conviver com os filhos por certo período.

Merece especial enfoque a modalidade da guarda compartilhada, inserida no Código Civil de 2002, especificamente nos artigos 1.583 e 1.584, a partir da publicação da Lei nº 11.698/2008.

A guarda compartilhada, assim, coaduna-se com a idéia de um verdadeiro chamamento dos genitores ao princípio da solidariedade humana, uma vez que imprescindível a superação mútua dos dissabores afetivos existentes entre eles em prol da prevalência de um diálogo permanente quanto a meios de promover a perfectibilização do pleno bem-estar da prole.

Haverá, assim, “dois lares”, um livre trânsito dos infantes de um lar ao outro, inobstante haja a fixação de uma residência “fixa” e regulamentação de um amplo e flexível regime de visitas.

Ambos os genitores persistirão interferindo na vida da prole à mesma intensidade e grau, como se ainda com estas permanentemente coabitassem.

Como vetores axiológicos, ter-se-á, sempre, os princípios da convivência familiar, da continuidade das relações familiares, do melhor interesse da criança e, ainda, o da igualdade entre os cônjuges, como balizadores e fundamentadores da idealização da guarda compartilhada.

Discussão remanescente na doutrina e jurisprudência pátrias cinge-se à possibilidade (ou não) de imposição judicial da guarda compartilhada, em que pese a legislação civil imponha sua aplicação “sempre que possível” , como modalidade preferencial. Ora, ante deflagrados atritos e permanente falta de harmonia entre possíveis personagens de uma guarda compartilhada, o questionamento arvora-se nos benefícios ou malefícios a surtirem mediante sua imposição.

A jurisprudência majoritária do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul - o qual ostenta a fama de “pioneiro” na seara jusfamilista - , é no sentido de que a guarda compartilhada pressupõe, em sua essência e para sua perfectibilização, o puro consenso e acordo entre os entes envolvidos, sob pena de mácula ao basilar princípio melhor interesse da criança e do adolescente, regente da fixação casuística do regime de guarda.

Ao revés, em recente julgado do Superior Tribunal de Justiça , a Excelsa Ministra Nancy Andrighi, em sua relatoria, fundamenta que a imposição da guarda compartilhada é imprescindível para infundi-la como regra no ordenamento jurídico pátrio:
“(...)A imposição judicial das atribuições de cada um dos pais, e o período de convivência da criança sob guarda compartilhada, quando não houver consenso, é medida extrema, porém necessária à implementação dessa nova visão, para que não se faça do texto legal, letra morta. 7. A custódia física conjunta é o ideal a ser buscado na fixação da guarda compartilhada, porque sua implementação quebra a monoparentalidade na criação dos filhos, fato corriqueiro na guarda unilateral, que é substituída pela implementação de condições propícias à continuidade da existência de fontes bifrontais de exercício do Poder Familiar(...)”

Veja-se, portanto, que a temática suscita divergentes posições e opiniões, malgrado positivada no Código Civil a preferência pela modalidade compartilhada de custódia como regra. Entrementes, há que se atentar, o magistrado familista, a quais, casuisticamente, as prováveis decorrências de dita imposição em todo e cada contexto, correlacionando-as às chances de eventual acirramento de ânimos, o que geralmente redunda em prática de alienação parental.

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